6 de fev. de 2013

[notícia] Exposição se transforma em livro: As origens do fotojornalismo no Brasil


O Instituto Moreira Salles de São Paulo abriu no dia 22 de novembro de 2012, a exposição As origens do fotojornalismo no Brasil: um olhar sobre O Cruzeiro (1940-1960), com mais de 400 imagens e matérias que revelam a história da principal revista ilustrada brasileira do século XX, e que foi decisiva para a implantação do fotojornalismo no país. A exposição teve como fio condutor a relação entre as imagens produzidas pelos fotógrafos e as fotorreportagens tal como foram publicadas. Essa abordagem teve como foco as décadas de 1940 e 1950, período de maior atividade e difusão da revista. A curadoria da mostra é da professora e curadora do Museu de Arte Contemporânea da USP, Helouise Costa, e de Sergio Burgi, coordenador de fotografia do Instituto Moreira Salles. A mostra ficou em cartaz no IMS-RJ entre julho e outubro deste ano e segue para Poços de Caldas depois de passar por São Paulo.

Na exposição, foram apresentadas algumas das contribuições de Jean Manzon, José Medeiros, Peter Scheier, Henri Ballot, Pierre Verger, Marcel Gautherot, Luciano Carneiro, Salomão Scliar, Indalécio Wanderley, Ed Keffel, Roberto Maia, Mário de Moraes, Eugênio Silva, Carlos Moskovics, Flávio Damm e Luiz Carlos Barreto. Muitas das imagens pertencem ao acervo IMS. Outras foram cedidas por outros arquivos: jornal Estado de Minas, Fundação Pierre Verger, APESP (Acervo Público do Estado de São Paulo), Coleção Samuel Gorberg e os acervos pessoais de Luiz Carlos Barreto e Flávio Damm.

Publicada pelos Diários Associados, empresa de comunicação pertencente a Assis Chateaubriand, a revista O Cruzeiro foi lançada em 1928 como uma publicação semanal de variedades, de circulação nacional. Tornou-se um dos mais influentes veículos de comunicação de massa que o país já conheceu. No início da década de 1940, incorporou o modelo da fotorreportagem, tornando-se pioneira na implantação do fotojornalismo no Brasil.

Como afirmaram os curadores, “o período da Segunda Guerra Mundial foi marcado por transformações sociais profundas que colocaram questões éticas contundentes no terreno da política de maneira geral e no campo da fotografia em particular. Uma das consequências foi a disputa entre duas diferentes concepções de fotojornalismo, materializada no cenário internacional a partir da fundação da Agência Magnum em 1947, e que teria forte repercussão na revista O Cruzeiro. De um lado situavam-se os fotógrafos integrados às condições do mercado, que entendiam que suas fotografias deveriam atender às demandas do sistema de comunicação de massa para conquistar o público. De outro, os fotógrafos que defendiam uma abordagem humanista do fotojornalismo e buscavam produzir um tipo de fotografia de cunho autoral comprometida com certas causas ou, no mínimo, menos sensacionalista. O que unia essas duas tendências era o grande domínio do código fotográfico e a utilização de uma linguagem moderna”.

A exposição buscou também refletir sobre o conceito de fotojornalismo. Em geral busca-se defini-lo como sendo o uso de fotografias e textos relacionados para representar acontecimentos da atualidade de acordo com certas estruturas narrativas. Esse critério, no entanto, diz respeito somente ao contexto de apresentação das imagens. Para compor a mostra em cartaz no IMS-SP, o fotojornalismo foi considerado pelos curadores como uma forma de representação social historicamente determinada e, portanto, em constante transformação. Um fenômeno ativo da vida social, conformador de visões de mundo e orientador das atitudes de indivíduos. No caso de O Cruzeiro, a exposição busca entender o seu papel social nos anos de 1940 e 1950 no Brasil. O questionamento do papel social do fotojornalismo e dos limites éticos de atuação dos profissionais da área tornou-se possível no Brasil a partir do término da Segunda Guerra, do fim do Estado Novo em 1945 e da abertura política daí decorrente. O advento de um fotojornalismo mais ágil e participativo, em contraposição ao encenado praticado por Jean Manzon, ganharia força na revista O Cruzeiro, a partir de então, pelo empenho de fotógrafos como José Medeiros, Luciano Carneiro, Flávio Damm, Luiz Carlos Barreto e Eugênio Silva. A saída de Jean Manzon da revista em 1951 iria contribuir para consolidar essa nova orientação. No lugar de uma fotografia posada e essencialmente simbólica, impunha-se agora uma fotografia mais espontânea, baseada nos princípios da veracidade. Tratava-se de uma mudança de paradigma, cujas causas não se encontram na fotografia, nem muito menos na mídia, mas no investimento coletivo da sociedade brasileira em se reconhecer ou não em determinados tipos de representação.

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Temas da exposição:

Em As origens do fotojornalismo no Brasil: um olhar sobre O Cruzeiro (1940-1960) será possível reconhecer os principais temas recorrentes nas páginas da revista ao longo das duas décadas analisadas. As informações abaixo, extraídas dos textos dos curadores da mostra, resumem cada um deles.

- A temática indígena: o índio é uma constante nas fotorreportagens de O Cruzeiro. Inaugurado em 1944 pela fotorreportagem de Jean Manzon e David Nasser sobre uma comunidade xavante nunca antes contatada, o tema do índio ganharia, nos anos seguintes, a contribuição de outros fotógrafos, em especial de José Medeiros e Henri Ballot.

- A imprensa e o sistema de arte: a virada das décadas de 1940 e 1950 no Brasil foi marcada pela fundação de importantes instituições culturais, como o Masp (1947), em São Paulo, e o MAM do Rio de Janeiro (1948). Embasados no discurso da democratização da arte, esses empreendimentos foram resultado da iniciativa privada. Quando Assis Chateaubriand criou o Masp, estabeleceu um estreito vínculo entre a dinâmica do sistema de arte local e os interesses da indústria de comunicação de massa. Não por acaso, O Cruzeiro publicaria constantemente fotorreportagens sobre o museu.

- A política na fronteira entre o público e o privado: os vínculos de Getúlio Vargas com O Cruzeiro remontam ao pedido de auxílio financeiro feito por Assis Chateaubriand, no final dos anos 1920, para o lançamento da revista. Vislumbrando os benefícios que poderia obter com a publicação, o então ministro da Fazenda intermediou a cessão dos recursos solicitados em troca de apoio político. Dali por diante, as relações de O Cruzeiro com Vargas seriam caracterizadas pela instabilidade. As matérias sobre o político gaúcho iam da adesão irrestrita aos ataques diretos, passando por momentos de apoio tácito.

- Faits divers e fotorreportagens seriadas – entre a notícia e a ficção: um dos muitos recursos utilizados pelas revistas ilustradas para atrair o interesse dos leitores era a publicação de reportagens ligadas ao universo dos chamados faits divers. O termo, de origem francesa, foi incorporado ao vocabulário do jornalismo para se referir a reportagens sobre temas que não se enquadram nas editorias tradicionais e têm pouca relevância social e política. A revista O Cruzeiro abriu um amplo espaço aos faits divers em suas fotorreportagens. Nessa linha investiu também em reportagens seriadas de média ou longa duração. Entre as séries mais conhecidas podemos citar o Crime do Sacopã ou o Casamento da índia Diacuí. As séries estimulavam o consumo regular da revista e induziam o público a colecioná-la.

- Fotojornalismo, arquivo e memória: O legado do fotojornalismo no Brasil ainda está longe de ser efetivamente conhecido. Embora se constitua em um certo relato sobre a atualidade, ele não pode considerado um simples suporte de informações objetivas. O fotojornalismo moderno produzido no Brasil entre os anos de 1940 e 1950 apresenta-se hoje como um passado distante, cujos vestígios estão abrigados em arquivos públicos e privados, de naturezas e proveniências diversas. É necessária uma reflexão sobre a importância dos arquivos gerados pelo fotojornalismo e sobre as indicações que oferecem para melhor compreendermos a complexidade histórica de sua prática.

Visite o site da exposição: http://ims.uol.com.br/ocruzeiro/localeglobal.html

Fonte: Instituto Moreira Salles

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